Vida e morte, escolha!


Parte 2

Viver é isso: ficar se equilibrando o tempo todo, entre escolhas e consequências.Jean Paul Sartre


Tempo. Ele continuava correndo desenfreado, louco. Tic tac, cada badalada do relógio sincronizado com as batidas frenéticas no peito. Sentia cada musculo do meu corpo, cada uma das pulsações do coração. O pulmão se enchendo e secando, ar entra e sai e aos poucos eu me afogo, não na água, mas em pleno ar. Podia recolher quanto oxigênio quisesse, porém mesmo assim sentia-o a faltar, nervosismo e medo.

15 minutos

Nós nos agrupamos juntos, parados e temendo as consequências de nossas escolhas. Eu acabara de dizer, aos meus chefes, que estávamos em um mal-entendido. Eu disse e não tenho certa se fizera a escolha certa. Aquilo martelava o peito. Sabia que diante das mãos tinha vidas que gritavam invisíveis em meus ouvidos, os gritos agudos e insanos.

10 minutos

Respiro fundo, eu acreditava que era uma falha no sistema, mas se não fosse. Fecho os olhos tentando me acalmar, os nervos iam à flor da pele. Parecia que ia ser rasgado ao meio pela indecisão, me cortando e serrando. Com os olhos fechados me sentia um pouco filosofo, talvez todos à beira da morte também se tornem, quem sabe. Me pego nas grandes questões, vida e morte, certeza e escolhas. Parecia que por minutos eu, como na alegoria de Platão, saíra da caverna e cegara pelo primeiro contato com o sol. Talvez eu enlouquecera, quem sabe.

5 minutos

Dizem que no último segundo de vida uma pessoa revê toda sua vida em como num filme. Revi todos os meus 44 anos e cada pedaço de minha vida repetido a cada segundo. Revia na minha frente meus filhos, esposa, trabalho, escola, pai e mãe. Vi meu próprio nascimento em 1939, Vladivostok. Meus dias na terra reprisados e marcados em flash, como em um filme esbranquiçado e desbotado. Sabia que aqueles eram meus últimos dias e talvez eu grave meu nome como herói ou monstro. Marcado na história, mas aquilo não me atraia, só desejava volta para casa beijar minha esposa e colocar meus filhos para dormir com uma pequena história, nada a mais.

3 minutos.

Olho ao redor e vejo mais rostos preocupados e brancos, finos como a agua. Neles via a confiança que haviam colocado em mim e com ela suas vidas. Desejaria honra-los com isso, mas não posso fazer muito mais que esperar junto com eles o fim. Todos olhavam sobressaltos para o relógio e para o cronometro no grande monitor central. Parecia que o tempo escorria de minhas mãos e com eles iam minha vida e sanidade. Tinha que segurar-me e não enlouquecer em meus últimos momentos em vida.

No fim, reconheço o que fiz e me orgulho seja qual for as consequências. Fiz o que considerei certo e diferente dos meus colegas que tomavam conta dessa instituição segui minhas próprias escolhas e não como um verdadeiro soldado que nesse momento só seguiria uma ordem e uma ordem, no telefone, de aniquilação. Não fui nenhum robô e no fim fui o que realmente sou um homem.

Nesse último segundo me despeço de meus colegas de trabalho e, mentalmente, de todos que conhecia. Por último, aqueles que amo e enfim a mim mesmo, Adeus eu.
Tempo, escolhas, fim.

0 minutos

Epigrafe

No dia 26 de setembro de 1983, Stanislav Petrov, salvou o mundo de uma guerra nuclear e de uma provável dizimação da raça humana. Seus atos foram repreendidos por seus superiores, por não acatar as ordens e para não manchar o nome da nação, escondido. O mesmo foi transferido para outra instalação menos importante e depois da morte de sua esposa reformado. Teve sua noticia espalhada somente depois da queda da união soviética, condecorado e mesmo assim a afirmar que não fez nada, além de seu trabalho. Faleceu em maio de 2017, aos 77 anos, o homem que salvou o mundo.

Parte I

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